quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Militar relata mortes na ditadura

Folha de São Paulo 8 de dezembro de 2010

Militar relata mortes em ação na ditadura

Dois militantes que atuavam na luta armada foram assassinados em operação na zona leste de SP, em 1970

Em depoimento inédito, ex-oficial do Exército diz à Folha que chefiou busca; segundo ele, agentes só reagiram

BERNARDO MELLO FRANCO
DE SÃO PAULO

Pela primeira vez, um agente da ditadura militar admite ter participado da operação que levou à morte de Antônio dos Três Reis de Oliveira e Alceri Maria Gomes da Silva, que atuaram na luta armada contra o regime.
O relato foi feito à Folha por Maurício Lopes Lima, 75, tenente-coronel reformado e ex-chefe de buscas da Oban (Operação Bandeirante).
Em novembro, o oficial foi acusado pelo Ministério Público Federal de participar de atos de violência contra a presidente eleita, Dilma Rousseff, e outros 19 presos políticos. Foi denunciado por vários, mas nega tudo.
Antônio, estudante de economia, tinha 21 anos e militava na ALN (Ação Libertadora Nacional). O Exército nunca admitiu sua morte. Alceri, 26, era operária e pertencia aos quadros da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária).
Os dois foram metralhados em 17 de maio de 1970 num aparelho (esconderijo) na rua Caraguataí, no Tatuapé, zona leste de São Paulo.
No depoimento inédito, o militar confirmou ter comandado a operação, alegou que Antônio teria atirado contra ele e classificou as duas mortes como "inevitáveis".
"Todas as equipes já tinham saído quando lá chegou não sei quem. E disse "Olha, o pessoal tá no aparelho, no Tatuapé... e no meio do corredor tem um alçapão'", relatou ele.
"Fui procurar o alçapão, encontrei (...) Peguei um canivete, enfiei, tirei e saiu um cara que me deu seis tiros. Saltei para trás [fazendo barulho de tiros], e ele atirava. Eu acho que esse era o Antonio Três Rios [sic]", disse.
Segundo Lima, Alceri chegou a ser retirada do local com vida. "Embaixo tinha uma menina, que também foi atingida e saiu com vida." "O Antônio morreu na ação. A mulher saiu viva e morreu a caminho do hospital. Baleada. Era a Alcira [sic]."
Apesar de admitir a presença na ação, ele disse não ter atirado. Responsabilizou agentes chefiados pelo capitão Francisco Antônio Coutinho e Silva, já falecido. "Não era minha equipe", disse.
O militar não esclareceu, no entanto, por que estaria acompanhado de agentes subordinados a um colega.
Ao justificar a morte de Antônio, Lima culpou a vítima: "Eu contei duas violências tremendas. Muitas vezes, inevitáveis. Como é que eu posso abrir um alçapão e me sai um cara e me dá um tiro na cara? Um não, seis."
O primeiro documento oficial sobre a morte do estudante, um laudo do IML localizado em 1991, diz que ele foi abatido com um tiro no olho direito. O laudo de Alceri contabiliza quatro tiros, sendo dois pelas costas.
O livro "Direito à Memória e à Verdade", publicado pela Presidência da República em 2007, afirma que, segundo ex-presos políticos, eles foram baleados "por agentes da Oban chefiados pelo capitão Maurício Lopes Lima".

DILMA
O militar recebe aposentadoria de R$ 11 mil brutos e vive a duas quadras da praia, no Guarujá, litoral paulista.
A ação da Procuradoria cita depoimento em que Dilma o apontou como "um dos torturadores da Oban". Em 2009, a presidente disse que ele não a agrediu, mas "entrava na sala e via tortura".
"Não assisti à tortura dela, não sei quem torturou. Eu chegava com o terrorista e entregava para o interrogador. Depois acontecia o que acontecia. Eu não sei, não queria saber", disse ele.
O oficial afirmou não ter arrependimentos. "Não tenho nenhum remorso", disse. "Eu estava numa guerra

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