Folha de São Paulo 14 de março de 2011
Direita ideológica some do quadro partidário brasileiro
Em crise no país, legendas liberais trocam de nome para tentar sobreviver
Militantes dizem faltar espaço para ideias de direita; especialista vê consenso social-democrata no Brasil
UIRÁ MACHADO
MAURICIO PULS
DE SÃO PAULO
Partidos explicitamente da direita ideológica tornaram-se produto raro no mercado político brasileiro. As legendas "liberais" praticamente desapareceram: das oito siglas com esse nome criadas após a redemocratização do país, só resta uma.
A remanescente é o PSL, que agrega o nome "social" ao "liberal" e tem um deputado federal. Os demais representantes do liberalismo decidiram trocar de nome após o fiasco eleitoral de 2006.
O PL fundiu-se com o Prona no PR (Partido da República) no final daquele ano, e o PFL passou a se chamar Democratas no início de 2007.
A mudança fez bem ao PR. O partido elegeu 40 deputados no ano passado, contra 23 em 2006 e 26 em 2002. Já o DEM mantém rota declinante: 105 deputados federais eleitos em 1998, 84 em 2002, 65 em 2006 e 43 em 2010.
Sem boas perspectivas, grande parte dos ex-liberais planeja seguir o prefeito paulistano Gilberto Kassab num processo de conversão maciça ao "socialismo" do PSB.
ALTERNATIVAS
A situação inusitada faz com que pessoas de direita não encontrem representatividade nos atuais partidos.
É o caso dos membros do Movimento Endireita Brasil. Filiados ao DEM, reclamam da falta de receptividade do partido "às ideias de direita, liberais" (veja texto abaixo).
Raciocínio similar guia o capitão da PM Augusto Rosa, de Ourinhos. Ele quer fundar o Partido Militar Brasileiro, de centro-direita -posição que "ninguém representa".
Para o cientista político Fernando Abrucio, da FGV, o quase sumiço das legendas liberais resulta do "consenso social-democrata que se consolidou no país após os governos FHC e Lula".
Segundo Abrucio, "hoje é praticamente inviável eleitoralmente defender abertamente bandeiras liberais, sobretudo se isso implicar cortes em gastos sociais".
HISTÓRIA
A marca "liberal" (nome de um grande partido da era imperial) ressurgiu em 1984, quando dissidentes do regime militar decidiram apoiar a candidatura de Tancredo Neves (PMDB) à Presidência.
O uso desse nome visava dissociar o grupo da ditadura militar e realçar sua adesão aos valores liberais (defesa da liberdade individual e crítica à ingerência do Estado).
Essa escolha foi reforçada pelas vitórias de políticos neoliberais no Reino Unido (Thatcher) e EUA (Reagan).
Em 1985, a Frente Liberal se transformou em partido. No mesmo ano, Alvaro Valle, outro dissidente da ditadura, fundou o Partido Liberal. No ano seguinte, os "liberais" elegeram 124 deputados federais, contra 57 dos partidos de orientação "trabalhista".
A queda do Muro de Berlim, em 1989, fortaleceu o liberalismo em todo o mundo. Francis Fukuyama, autor de "O Fim da História", anunciou a sua vitória definitiva. Na avaliação do economista Roberto Campos, o liberalismo tinha vencido não apenas como doutrina intelectual, mas "como práxis política".
A partir de 1990, os governos Collor (1990-1992), Itamar (1992-1994) e FHC (1995-2002) adotaram medidas liberalizantes, privatizando estatais e desregulamentando as relações trabalhistas.
No plano da "práxis política", porém, a história teve curso mais complicado. Os resultados eleitorais dos "liberais" se revelaram piores que os dos "trabalhistas".
As poucas legendas que adotaram o termo "liberal" logo sumiram, e PFL e PL desistiram da marca após 2006.
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