Folha de São Paulo de 05 de dezembro de 2008 publica importante entrevista de Richard Sennett e sua mulher sobre a questão urbana.
Para pesquisadores, cidades devem buscar diversidade
Sociólogos dizem que atividades econômicas variadas são a única forma de escapar da crise
Saskia Sassen e Richard Sennett, que estudam as sociedades das grandes metrópoles, visitam o Brasil para o evento Urban Age
Apostar em várias atividades econômicas é a única maneira de São Paulo escapar da crise mundial, afirma um dos casais acadêmicos mais prestigiados do mundo, os sociólogos Saskia Sassen e Richard Sennett.
Em visita ao Brasil para o Urban Age, eles falaram à Folha sobre as características da capital paulista, que, segundo Sennett, tem uma sociedade vibrante e um governo contido.
Sociólogos e casados há 20 anos, eles estudam as sociedades das grandes metrópoles mundiais. A holandesa Saskia, professora da Universidade Columbia, em NY, enfatiza as questões econômicas, enquanto o americano Sennett, professor da LSE (London School of Economics) e da Universidade de Nova York, enfoca o lado cultural das transformações.
FOLHA - Como é estar no Brasil?
SASKIA - Já estive em várias cidades brasileiras, como Recife e Porto Alegre. Minha experiência aqui é a de que as cidades estão cheias de potencial, mas a estrutura de serviços não dá mais conta.
SENNETT - Diria o mesmo, mas de forma diferente. A sociedade aqui é vibrante, mas governada por instituições reprimidas, que não refletem a vida que se vê nas ruas.
FOLHA - Como mudar isso?
SENNETT - Tenho preconceito quanto a uma intervenção do governo, pois a mudança das cidades sempre vem de baixo.
Vejo as pessoas, as mais humildes inclusive, como recursos, mas o governo muitas vezes quer se ver livre delas. Nas cidades, a vida nunca é planejada, ela vem das ruas, das pessoas.
FOLHA - Cada cidade tem uma vocação distinta?
SASKIA - Diria que a cidade, a urbanidade, é um projeto coletivo. E a cidade tem uma capacidade de interferir no seu próprio funcionamento maior do que a esfera federal, que tende a transformar conflitos em guerra. Metrópoles têm, sim, suas especificidades, que eu gosto de chamar de "história econômica profunda".
São Paulo, por exemplo, tem como "história econômica profunda" a evolução da atividade manufatureira. Hoje, apesar de a cidade ser marcada por uma intensa atividade financeira, ainda é vista como manufatureira por muita gente.
FOLHA - O conhecimento produzido por uma cidade é uma forma de economia?
SASKIA - Sim. Uma cidade como São Paulo teve de aprender a desenvolver seus serviços profissionais, fossem de manufatura, mineração etc. -saber construir fábricas, montar linhas de produção. Mas os estrangeiros vêm, extraem daqui esse conhecimento e vendem-no como um serviço especializado. Se você quer aprender a lidar com o aço, por exemplo, você virá para São Paulo, pois é aqui que se aprende. SENNETT - Há 20 anos tínhamos uma idéia de que havia uma nova economia para as cidades, baseada na alta tecnologia, na propaganda, na moda. Esse novo capitalismo basicamente rejuvenesceu as cidades, mas não fez muito pelas pessoas menos favorecidas.
Se você fizer com que uma cidade se dedique inteiramente a uma coisa, como se tornar uma potência financeira, você a estará enfraquecendo em seu cotidiano. E isso não é mais uma crítica de esquerda, pois estamos vendo o que está ocorrendo: esse tipo de capitalismo gera uma enorme desigualdade.
FOLHA - Qual será o impacto da crise financeira nas cidades?
SENNETT - Minha expectativa é que a crise financeira vai produzir um desemprego enorme.
São Paulo não é Detroit [EUA], que vive de uma monocultura [a indústria automotiva], é diversificada. É preciso haver mais diversidade.
SASKIA - O que eu sei é que as cidades estão se tornando mais violentas e isso tem raiz na desigualdade econômica. A economia é uma das forças de que se alimentam as cidades. Não dá para concentrar os investimentos no setor financeiro. É preciso apoiar as fábricas, mineradoras, agricultores, alimentar as outras forças.
FOLHA - O que contribuiu para aumentar a desigualdade?
SASKIA - Boa parte dos recursos dos setores intermediários foi sugada por quem está no topo da escala, fazendo com que eles ganhassem tanto dinheiro, que ficou difícil de ver esses valores voltarem a circular pela cidade.
Funcionaria melhor se houvesse empresas modestas, com lucros modestos.
SENNETT - Isso se reflete nos jovens, nem todos têm acesso a esse mundo de luxo. Dizer isso é meio clichê, mas o que me impressiona é que os que ficavam milionários na meia-idade, agora ficam aos 25 anos, aumentando a desigualdade.
O crescimento poderia se espalhar e beneficiar a todos.
FOLHA - Qual o modelo para SP
SENNETT - Bom, isso, vocês é que terão de descobrir.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário