Folha de São Paulo, sábado, 23 de janeiro de 2010
Organizações são mal necessário, diz especialista
DE GENEBRA
David Lewis, professor de política social na London School of Economics, avalia que as ONGs estão em baixa, mas são um "mal necessário". Para ele, as entidades pecam por um excesso de desorganização que atrapalha sua eficácia, mas ao mesmo tempo são úteis ao complementar o trabalho do Estado com projetos mais ousados e diversificados.
FOLHA - Qual o problema de coordenação das ONGs?
DAVID LEWIS - Nada de novo. Acho que embora as pessoas que trabalham nas ONGs geralmente sejam movidas pelo altruísmo, as ONGs como instituição são individualistas e autocentradas. Elas competem por fundos quando não estão em campo, e por isso precisam mostrar que estão fazendo um determinado trabalho. Por outro lado, as ONGs têm estruturas e focos diferentes, e podem ousar mais meio que por serem mais amadoras. Dentro disso, a falta de coordenação pode se tornar importante para elas às vezes.
FOLHA - Como assim?
LEWIS - As pessoas costumam pensar "se estou dando US$ 10 a uma ONG, quero ver US$ 10 chegarem às pessoas em necessidade". Elas não querem saber que 20% vai para custos administrativos. Muita gente que doa para as ONGs é pouco realista, e há uma certa pressão para que elas não gastem dinheiro em administração. Muitas vezes as ONGs acabam sendo vítimas das expectativas.
FOLHA - Na lista de doadores no site da ONU, a fração de donativos às ONGs é bem menor que a entregue à ONU ou gerenciada pelos governos doadores. Há desconfiança?
LEWIS - Acho que as ONGs hoje não são mais tão populares. Nos anos 60 e 70, ninguém falava em ONG -claro, tinha algumas, mas elas não eram um ator importante nas ações humanitárias. Aí nos anos 80 foram "descobertas" e passaram a ser consideradas a solução de muitos problemas, pois era a época do neoliberalismo, de enxugar o Estado. Já no fim dos anos 90, elas começaram a sair de moda, em parte porque sua performance não atendia às expectativas, em parte porque os doadores passaram a apoiar mais ações governamentais novamente. Também acho que as pessoas passaram a se preocupar com a falta de prestação de contas. Hoje os sentimentos são contraditórios sobre as ONGs. Elas não são mais consideradas organizações honradas, mas mais como um "mal necessário" na falta de alternativas.
FOLHA - Como elas tentam superar essas limitações?
LEWIS - O que algumas têm feito é adotar um acordo sobre padrões. Hoje o mais conhecido é o Sphere, que estabelece padrões em termos de transparência, qualidade etc. Outra coisa é que emergiram novos tipos de ONG, como os Médicos Sem Fronteiras, mais pragmáticas. Eles vão lá e só querem prestar cuidados médicos, sem se meter em política.
FOLHA - Como escolher para quem doar? Há parâmetros?
LEWIS - Acho que o único parâmetro é que elas prestem contas. Como doador, você tem de pedir que elas abram seus balanços. Mesmo assim é difícil. Você vai procurar quem alimenta mais gente com US$ 100 por dia no Haiti ou vai olhar como as pessoas estarão um ano após o início da ação?
FOLHA - As pequenas ONGs estão atuantes no Haiti?
LEWIS - Há uma mistura. Há umas muito pequenas, semana passada teve um grupo de pessoas que embarcou para o Haiti para tirar gente de escombros. Pode não ser nem uma ONG formal. E na outra ponta há essas ONGs superprofissionais, que parecem corporações.
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