É importante que se debata o Parecer da PGR sobre a procedência da ADPF
153 promovida pelo Conselho Federal da OAB. É um material importantissimo
para discutir com o nosso alunado e a urgência de mudança do perfil do
ensino jurídico. O regime de 88 completa, na verdade, 25 anos de seu
início com a "transição lenta e gradual" inciada pelo General Presidente
Geisel na época de Golbery (1974) e concluída, formalmente, por um
processo negociado por Tancredo Neves em 1985. O parecer tornado público
hoje é, na verdade, desastroso, um retrocesso para a democratização da
sociedade brasileira. Demonstra a imperiosidade da busca urgente de novos
fundamentos na formação jurídica brasileira. É inexplicável que a PGR atue
de forma pontual avançada incorporando o que é de mais crítico da
Antropologia Social na defesa das sociedades indigenas, por exemplo, no
caso Raposa Serra do Sol e adote uma postura a mais retrógada possível
tanto no caso da Extradição/Refúgio do Battisti e agora ao se pronunciar a
respeito da ADPF 153. Argumenta-se:
1. Mais de um terço do parecer está voltado para a questão da natureza e
da admissibilidade da ADPF 153. Atua o parecer de modo a retirar a atenção
de questões de fundo para um mero formalismo. Não se preocupa, aliás, em
nenhum momento dar um sentido mais finalistico ao alcance da Lei n°
9.882/99 na defesa da Constituição e dos Direitos Fundamentais;
2. Cita J. Elster mas esquece de mencionar a sua obra estratégica para
compreender a ADPF 153 - Justiça Transicional! O Parecer em exame
desconhece, totalmente, o debate a respeito dessa temática;
3. Principalmente na parte mais formalista e depois em certos pontos de
conteúdo fia-se sempre na AGU como detentora mais certa da interpretação
das consequências da Lei da Anistia;
3. Transforma Sepulveda Pertence em verdadeiro "oráculo de Delfos" para
dar sentido ao contexto histórico a partir do movimento iniciado por
Terezinha Zerbini em 1975. Cita, a título de exemplo, uma fala do novo
"oráculos de Delfos" que a Lei da Anistia cobriria a parte penal mas
deixaria em aberto a responsabilidade civil do Estado. Dando a entender,
assim, que a discussão estaria resolvida mais no campo cível;
4. Além de dedicar um terço de discussão formalista sobre a ADPF, grande
parte do Parecer em exame é uma rala reconstituição histórica do
encaminhamento político e legislativo da Lei da Anistia. Em nenhum
momento, levanta-se a questão da legitimidade dos agentes públicos
responsáveis por crimes de lesa humanidade. Aliás, aqueles que sofrerão a
dureza e a brutalidade da repressão ilegitima são reduzidos como meros
"opositores políticos". Aliás, há uma passagem citada no Parecer da PGR ao
mencionar palavras de Franco Montoro que o problema da anistia é esquecer
de saber quem atirou a primeira pedra;
5. O Parecer da PGR não compreende em nenhum momento se quer o verdadeiro
alcance da bandeira da anistia ampla, geral e irrestrita. Procura, na
verdade, distorcer o seu sentido. Em hipotese nenhuma, ao contrário do que
expôe mencionado Parecer, objetivava-se alcançar os repressores de 64. A
idéia da amplituda da anistia era porque regime militar almejava apenas
limita-la aos "crimes" como de liberdade de expressão, etc. Fala-se do
Governo Figueiredo mas não é impositivo o Parecer em condenar o último
general presidente na forma como conduziu e impôs a anistia;
6. O mais preocupante para a formação jurídica brasileira em pleno século
XXI é que a PGR desconhece, totalmente,o sistema interamericano de DH,
tratados de direitos humanos, não enfrenta a questão da
imprescritibilidade da tortura, não aborda a vedação pela Corte
Interamericana de DH da autoanistia (o caso dos Barrios Altos no Peru).
Em sintese, a PGR, nesse início da segunda década do século XXI, abre uma
senda perigosa no tocante a defesa dos Direitos Humanos no Brasil. O
parecer ora lido demonstra os limites profundos de uma visão mais ampla e
densa de Direitos Humanos em nossa sociedade. Torna mais claro porque há
no Estado e na sociedade brasileiras resistência ao PNDH -3. O parecer
aponta para uma discussão, reiterando, formalista de ADPH e envereda-se
por uma sustentação política superficial e equivocada a respeito da Lei da
Anistia. É incapaz, assim, o parecer na sua parte material enfrentar de
forma densa e elucidativa para a sociedade brasileira o tema de Direitos
Humanos Ribas
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