Folha de São Paulo, sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Assembleia venezuelana consolidou modelo chavista
Casa aprovou leis de reforma constitucional que foi derrotada em referendo
Deputados ainda ficam três meses no poder após eleição de domingo e podem aprovar mais medidas controversas
FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS
A renovação da Assembleia Nacional da Venezuela a partir de 5 de janeiro de 2011 deve marcar o fim de uma era na qual o presidente Hugo Chávez teve cheque em branco do Legislativo para aprofundar reformas. Os venezuelanos têm eleição legislativa neste domingo.
"Seja qual for o número de cadeiras que a oposição obtiver no domingo, a Assembleia voltará a ser um foro político, deixará o caráter aclamacionista dos últimos cinco anos", afirma o ex-constituinte Vladimir Villegas, que ocupou o cargo de embaixador no Brasil.
"O presidente terá de entender essa nova realidade política. Caso contrário, o que nos espera é mais conflito", continua Villegas, que deixou o chavismo em 2007 e é candidato a deputado pelo centro-esquerdista PPT (Pátria Para Todos).
Produto do boicote da oposição às eleições parlamentares realizadas em 2005, a Assembleia Nacional dominada pelo chavismo ajudou a desenhar a cara do segundo mandato do presidente (2007-2012), no qual Chávez enunciou o desejo de implantar o "socialismo do século 21" no país. Foram 157 leis aprovadas.
A Casa outorgou ao presidente, por aclamação, a chamada lei habilitante, a prerrogativa de legislar por decreto -por isso chamada por Chávez de "mãe das leis revolucionárias".
Pela lei habilitante, o presidente decretou a nacionalização do setor petroleiro -renegociação compulsória de contratos petroleiros, com cota mínima de 60% para o Estado- e reformou a organização das Forças Armadas do país.
Um ano depois, a Assembleia ampliaria as mudanças do decreto militar. Pela norma, as Milícias Bolivarianas, formadas pelo contingente de reserva e por civis com breve treinamento militar, passaram a ser o 4º componente das Forças Armadas.
A supermaioria chavista também transformou em lei parte da proposta de reforma constitucional de Chávez que havia sido derrotada em consulta popular em 2007.
Uma das medidas ressuscitadas e aprovadas pelos parlamentares foi o esvaziamento de competências da prefeitura do distrito metropolitano de Caracas -pouco após um oposicionista ser eleito para o cargo.
A conformação do CNE (Conselho Nacional Eleitoral) é um legado mais perene da Legislatura 2005-2010.
Eleitos em 2006 e em 2009 para um mandato de sete anos, os atuais cinco juízes eleitorais -sendo quatro considerados chavistas- regerão a escolha presidencial de 2012. A procuradora-geral da República, Luisa Ortega Díaz, fica no cargo até 2014.
PODER POPULAR
"Essa Assembleia garantiu a democracia participativa que está na Constituição", diz Darío Vivas (Partido Socialista Unido de Venezuela), vice-presidente da Assembleia e candidato à reeleição.
A Casa aprovou em 2006 a lei dos conselhos comunais -status legal para organizações de vizinhos, que passaram a receber recursos estatais. Apesar das críticas sobre aparelhamento político, os conselhos se espalharam e têm adesão até nas áreas nobres de Caracas, dominadas pela oposição.
Os atuais deputados terão ainda três meses para legislar. Parte dos analistas aposta que, independentemente dos resultados, o governo usará esse tempo para aprovar o maior número de normas possíveis.
Há vários projetos controversos na fila, por exemplo, a "lei de licitações". Além de facilitar o processo de escolha de fornecedores e construtoras pelo Estado, ela permite ao governo expropriar bens de empresas se julgar que os contratos não foram cumpridos.
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