quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A posição do Brasil sobre o massacre em Gaza

Folha de São Paulo 15 de outubro de 2009

Brasil propõe paliativo a relatório sobre Gaza
País defende investigações sobre crimes de guerra, mas não quer que texto seja enviado a Conselho de Segurança nem a corte internacional

Argumentos são defesa do processo de paz na região e risco de bloqueio dos EUA a aprovação do texto, crítico a Israel e ao Hamas, no CS



O Brasil defenderá hoje em sessão especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU em Genebra uma adoção intermediária das recomendações do relatório com investigações lideradas pelo juiz Richard Goldstone sobre o conflito na faixa de Gaza no início do ano. O documento afirma que Israel e grupos armados palestinos cometeram crimes de guerra e, possivelmente, crimes contra a humanidade.
O Brasil endossa o relatório e defende que sejam feitas investigações sobre a conduta das duas partes no conflito. Na avaliação do país, no entanto, o informe não deve ser enviado para o Conselho de Segurança da ONU (CS) e nem para o Tribunal Penal Internacional (TPI), como propõe o documento.
"O relatório é um documento sério. O governo brasileiro avalia que uma escalada dessa proporção, enviar o relatório para o Conselho de Segurança e para o TPI, pode desestabilizar as conversas de paz em curso na região", afirma a embaixadora do Brasil nas Nações Unidas em Genebra, Maria Nazareth Farani Azevedo.
A posição do Brasil visa fortalecer o Conselho de Direitos Humanos. No CS há um risco maior de que o documento seja derrubado pelos EUA, aliados históricos de Israel.
O relatório deveria ter sido examinado durante as sessões regulares do Conselho de Direitos Humanos. Mas, no início do mês, a Autoridade Nacional Palestina (ANP), dirigida pelo Fatah, facção rival do Hamas, retirou o apoio ao relatório, cedendo à pressão dos EUA. O premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, ameaçou deixar as conversas de paz se o relatório seguisse adiante.
O custo político dessa decisão para o presidente da ANP, Mahmoud Abbas, foi elevado -tanto que um de seus auxiliares afirmou que a decisão foi um erro. Abbas passou a ser criticado na faixa de Gaza, controlada pelo Hamas, e na Cisjordânia, controlada pela ANP. E tenta agora reverter a situação.
A reunião de hoje, e que deve continuar amanhã, é resultado de uma iniciativa dos palestinos, que obtiveram as 16 assinaturas necessárias para a realização do encontro especial.
Embora a resolução possa passar no Conselho de Direitos Humanos com 50% dos votos, os palestinos almejam maioria.

Em Nova York
Paralelamente, os palestinos iniciaram ontem o esforço para que o relatório seja aprovado de forma integral em uma reunião sobre Oriente Médio realizada no âmbito do CS em Nova York. A reunião estava marcada para o dia 20, mas foi antecipada para discutir o relatório.
Em discurso, a embaixadora Maria Luiza Viotti, chefe da representação brasileira em Nova York, afirmou que "a prioridade imediata deve ser sustentar a esperança do povo na região de que a paz é possível e que as negociações podem alcançar resultados".
O ministro das Relações Exteriores da Autoridade Nacional Palestina, Riyad al Maliki, definiu o relatório como "um chamado de despertar que não pode ser esquecido". Disse ter esperanças de obter a aprovação do Conselho de Direitos Humanos na reunião de hoje.
Para a embaixadora de Israel na ONU, Gabriela Shalev, o relatório "nega o direito de Israel de defender seu povo" e "favorece e legitima o terrorismo".
O vice-embaixador dos EUA na ONU, Alejandro Wolff, afirmou que os EUA veem com preocupação o foco desproporcional em Israel, que "tem condições de conduzir investigações, mas o Hamas não tem habilidade nem vontade de rever seu comportamento".
Wolff disse ainda que "as alegações de violação de direitos humanos não são matéria para ação do CS".

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