Folha de São Paulo de 10 de maio de 2009
São Paulo, domingo, 10 de maio de 2009
Brasil tem que ser "nação rebelde", diz Mangabeira Unger
Escanteado nos pactos após a 2ª Guerra, país precisa assumir protagonismo, afirma ministro de Assuntos Estratégicos
Intelectual identifica maior interesse dos brasileiros em questões diplomáticas, o que aponta como um traço das grandes democracias
Embora tenha vocação natural para o protagonismo geopolítico, o Brasil só agora começa a buscar uma posição de destaque no sistema internacional.
A avaliação é de Roberto Mangabeira Unger, professor de direito da Universidade Harvard que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu, em 2007, para comandar a então recém-criada Secretaria de Assuntos Estratégicos.
Em entrevista à Folha, por telefone, o ministro disse que o descompasso entre a aspiração do Brasil e sua inserção real remonta ao fim da Segunda Guerra (1939-1945), quando o país ficou fora dos pactos entre os vencedores, que criaram o sistema global hoje em vigor.
O fortalecimento da projeção brasileira, para o ministro, passa pela aliança estratégica com Rússia, Índia e China -demais integrantes do Bric, grupo de emergentes que faz sua primeira cúpula em 16 de junho, em Ekaterinburgo (Rússia). Mangabeira Unger é o coordenador brasileiro do Bric.
POTÊNCIA ÓRFÃ
A China e, principalmente, a Rússia saíram como vitoriosas da Segunda Guerra Mundial. Nós, apesar da participação no conflito, não fomos classificados como tal. O Brasil é obrigado a ser uma nação rebelde, pois somos órfãos dos acordos acertados [entre as potências] após as duas guerras mundiais.
DIPLOMACIA EM ALTA
Está surgindo no Brasil algo típico das grandes democracias, que é o desmoronamento das barreiras entre política externa e interna. A diplomacia virou um debate nacional.
Nas grandes nações, projetos estratégicos de desenvolvimento importam mais do que temas de política interna. Países poderosos sempre ponderam se a ordem mundial facilita ou inibe suas metas estratégicas e não veem a política externa como um ramo do comércio. As potências seguem agenda geopolítica que transcende objetivos puramente econômicos. Aliás, o comércio segue o poder, e não o contrário.
SIMPATIA UNIVERSAL
Somos uma democracia -apesar de falhas- vibrante e fomentada na unidade nacional. Além disso, não temos adversários. De todos os grandes países da história moderna, somos o menos beligerante e o que teve menos contato com guerras. Assim, desfrutamos de uma simpatia quase universal. Mas isso não nos exime de nos defender. Há uma relação íntima entre defesa e diplomacia. Não vejo risco de nos envolvermos numa guerra. Mas é melhor para o mundo que os fatores da paz possam se defender.
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