Folha de São Paulo, sexta-feira, 01 de maio de 2009
Apesar de retórica, Obama não mexe em lista do terror
Relatório do Departamento de Estado, 1º do novo governo, mantém Cuba, Irã, Síria e Sudão
Teerã acusa EUA de praticar tortura, Havana diz que Casa Branca é "delinquente internacional" e Caracas compara democrata a Bush
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Se o discurso mudou, a política continua a mesma. Pelo menos segundo relatório anual sobre terrorismo que o Departamento de Estado norte-americano prepara a pedido do Congresso dos EUA.
No divulgado ontem, com dados recolhidos ainda sob George W. Bush, mas já sob a chancela do presidente Barack Obama e da secretária Hillary Clinton, Cuba, Irã, Síria e Sudão aparecem como "Estados patrocinadores de terrorismo".
A quadra já constava dos relatórios de Bush, que removeu a Coreia do Norte da lista em 2008. Pois esse país continua fora, mas os outros quatro não ganharam a deferência. Na prática, isso significa que não podem receber ajuda econômica nem fazer tratados comerciais e acordos financeiros com os EUA, entre outros vetos.
A decisão se choca com a retórica conciliatória de Obama. Por ocasião do Ano Novo persa, o democrata gravou mensagem positiva ao povo iraniano e ao regime dos aiatolás. Nas últimas semanas, derrubou as restrições de viagem e remessas de cubano-americanos para Cuba.
O tom é outro no texto. "O Irã continua o Estado patrocinador de terrorismo de maior importância" no mundo.
O relatório acusa o país de armar clandestinamente, via Guarda Islâmica Revolucionária (também conhecida como Forças Especiais Quds), o Hizbollah no Líbano, o Hamas na Palestina, a insurgência iraquiana e mesmo o Taleban na fronteira Afeganistão-Paquistão, que sob Obama se tornou a maior frente militar dos EUA.
Diz que o Quds está presente até mesmo na América Latina, onde o governo iraniano está tentando "expandir seus laços militares", segundo o documento. Na região, outro governo com o qual a nova Casa Branca vem ensaiando uma distensão aparece sob ótica negativa. De acordo com o texto, a Venezuela foi certificada como país "que não coopera totalmente" com os EUA na luta contra o terrorismo.
Entre os fatores de preocupação da Chancelaria norte-americana em relação a Hugo Chávez está o estreitamento de relações com o Irã. É ressaltada a suposta falta de rigor na vigilância de passageiros dos voos entre a capital venezuelana e Teerã, o que faria do aeroporto Simón Bolívar "uma estação de entrada potencialmente atrativa para terroristas".
A interação maior do Irã com os governos esquerdistas latino-americanos é preocupação presente no relatório, aparecendo também nos verbetes da Bolívia -é citado o anúncio de Evo Morales de que abriria embaixada em Teerã- e da Nicarágua -no caso, a decisão do presidente Daniel Ortega de não exigir visto dos iranianos.
Outro ponto de atrito são as relações do governo venezuelano com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias de Colômbia), grupo armado que Washington considera "terrorista", e Caracas, apenas "beligerante". A guerrilha também aparece no texto sobre a Nicarágua, no qual o governo de Ortega é criticado por manter "estreita relação" com as Farc.
Irã, Cuba e Venezuela rejeitaram as conclusões do relatório e acusaram os EUA de "não ter autoridade moral" para julgar condutas alheias.
Teerã disse que a Casa Branca "aplica tortura" na prisão de Guantánamo e apoia a ocupação israelense de terras palestinas, Havana acusou Washington de ter histórico de "delinquente internacional" por praticar "terrorismo de Estado" e Caracas afirmou que o documento "tem muito de Bush".
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