Folha de São Paulo, domingo, 05 de abril de 2009
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Crise radicaliza ação de sindicatos na França
Desesperados, funcionários de empresas em dificuldades sequestram altos executivos para tentar evitar onda de demissões
Especialista prevê agravamento de tensões; desemprego no país atinge 2,38 milhões de pessoas, ou 8,5% da população ativa
ANA CAROLINA DANI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS
Na última terça-feira, cinco executivos de uma filial francesa do grupo norte-americano Caterpillar foram tomados como reféns e passaram a noite retidos nos escritórios da empresa, instalada na região de Grenoble, no sul da França.
Eles não foram vítimas de nenhum comando terrorista e muito menos atacados por sequestradores. Os executivos, entre eles o diretor-geral da fábrica na França, Nicolas Polutnik, foram retidos pelos próprios empregados, que protestavam contra o plano de demissões anunciado pela empresa.
Segundo os sindicatos, a decisão foi tomada porque a direção se negava a negociar as condições de saída e o valor das indenizações que seriam repassadas aos assalariados.
Em janeiro deste ano, o grupo Caterpillar anunciou a supressão de 25 mil postos de trabalho em todo o mundo, sendo 733 na fábrica de Grenoble. Os sindicatos tentavam negociar melhores indenizações e pediam a redução do número de demissões.
O exemplo da Caterpillar, que está longe de ser um caso isolado, ilustra o clima de crescente tensão social que vive o país. Também na última terça-feira, cerca de cem empregados das redes Fnac e Conforama, filiais do grupo PPR, bloquearam por quase uma hora o táxi que transportava o presidente do grupo, François-Henri Pinault.
O empresário, à frente do segundo maior grupo de luxo do mundo, somente pôde seguir viagem após a intervenção da polícia. Os empregados também protestavam contra o plano de restruturação, anunciado no dia 18 de fevereiro, que prevê a redução de 1.200 postos de trabalho nas duas empresas.
Na semana anterior, no dia 25 de março, executivo de uma fábrica de remédios na França, filial do grupo norte-americano 3M, também foi feito refém por mais de 24 horas. Poucas semanas antes, no dia 13 de março, o presidente da Sony no país, Serge Foucher, já havia sido retido por mais de um dia por empregados da fábrica de Pontonx-sur-l'Adour, na região dos Landes, sudoeste da França.
Os assalariados tentavam uma última cartada para evitar o fechamento do local, previsto para o próximo dia 17 de abril.
Tensão
"A multiplicação dos anúncios de supressão de empregos em um contexto de grave crise econômica levou a uma evidente radicalização dos movimentos e das relações sociais", avalia Guy Groux, sociólogo, especialista em movimento sociais e professor do Instituto de Ciências Políticas de Paris.
Segundo ele, ações radicais como sequestros de empresários, barricadas em estradas ou ocupação de fábricas devem se tornar mais frequentes nos próximos meses.
Desde que a crise financeira mundial se transformou em crise econômica, não se passa uma semana sem que uma empresa na França anuncie planos de reestruturação, muitos deles prevendo demissões.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Estudos Econômicos (Insee), somente nos seis primeiros meses deste ano, 387 mil empregos devem desaparecer no setor privado francês.
Com isso, a taxa nacional de desemprego tem crescido. Somente no mês de fevereiro, cerca de 80 mil pessoas ficaram desempregadas, registrando o segundo mês consecutivo de aumento da desocupação, que atinge 2,384 milhões de pessoas, ou o equivalente a 8,5 % da população ativa.
Para o especialista em relações sociais Hubert Landier, a crise econômica é a principal causa da radicalização das ações dos sindicatos e dos trabalhadores, mas não a única. "Na França, as relações sociais são fundadas muito mais na confrontação do que na busca do compromisso, como é o caso na Alemanha e nos países do norte da Europa", afirma.
Landier também aposta no agravamento da tensão social no país. "Muitas empresas que puderam até o momento resistir com medidas como férias coletivas ou suspensão temporária da produção serão obrigadas a demitir nos próximos meses, o que deve contribuir para novas ações violentas", afirma.
Segundo ele, é necessário evitar comparações simplistas. "São trabalhadores, e não criminosos, que optaram por um tipo de ação radical, por desespero e para chamar a atenção da opinião pública e do governo", conclui.
Desde o inicio deste ano, duas greves paralisaram parcialmente a França. A mais recente, no dia 19 de março, reuniu entre 1,2 milhão e 3 milhões de pessoas, em várias cidades. Ante o aumento do desemprego e da pressão social, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, anunciou na semana passada a nomeação de um secretário para a reindustrialização, a fim de coordenar ações do governo nas regiões industriais mais afetadas pela crise.
O governo também decidiu proibir a atribuição de bônus e de opções conversíveis em ações a executivos de empresas ajudadas pelo governo.
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